Em defesa da terminologia de ecossistema de inovação
O conceito de ecossistema de inovação é utilizado muitas vezes sem o rigor necessário (OH et al. 2017, GOMES, 2018 ). Isso ocorre, principalmente, devido a flexibilidade do termo. Desse modo, muitos autores utilizam-o de maneira análoga ao conceito de sistemas de inovação ou com perspectivas distintas. As diferenças entre sistemas de inovação e ecossistemas de inovação já foram discutidas em outros posts (aqui). Superado isso, este post avança a discussão sobre a importância de utilizar o termo ecossistema de inovação como um conceito autônomo. Ainda, examina maneiras de progredir. Para tanto, utiliza-se como referência o artigo de Ritala e Almpanopoulou (2017) publicado na revista científica Technovation.
Terminologia ecossistema de inovação
Ao analisar o termo ecossistema, torna-se importante verificar suas partes: eco e sistema. Aliado a isso, o seu foco, inovação. O eco está relacionado a ecologia. Assim, significa a interdependência e a co-evolução entre os diferentes atores que afetam o equilíbrio e a dinâmica do processo. Por sua vez, um sistema refere-se a um conjunto específico de componentes (atores, organizações, entidades) que são interdependentes, mas independentes de outros sistemas.
Além disso, o espaço e o tempo desempenham um papel crucial para os ecossistemas biológicos. Assim como, para os ecossistemas de inovação, onde algumas fronteiras podem ser traçadas. Por exemplo, com a identificação da empresa focal, como o “ecossistema da Lego” ou a discussão da inovação ou tecnologia em torno da qual o sistema é formado. O seu limite também pode ocorrer pelo escopo geográfico (local vs. regional ou nacional vs. global). Também por escala temporal (passado, futuro ou instantâneo estático vs. interação dinâmica). Ainda, por sua permeabilidade (aberto vs. fechado); ou tipos de fluxo (conhecimento, valor, material) (VALKOKARI, 2015).
Finalmente, o termo inovação refere-se a criação de novos conhecimentos e invenções, e sua adoção comercial bem-sucedida. Portanto, o termo ecossistemas de inovação envolve o sufixo eco, a palavra sistemas e inovação. Cada qual com suas características que agrupadas dão forma a terminologia.
Confusão conceitual
O conceito de ecossistema de inovação tem sido adotado para descrever sistemas de inovação orientados a lucros em torno de empresas, tecnologias e plataformas focais. No entanto, tem havido também uma tendência de políticas públicas para apoiar iniciativas de inovação em nome do desenvolvimento econômico e do progresso social. Como Oh et al. (2016) descreve, isso significa que o conceito de ecossistema de inovação começou a se infiltrar em espaços mais tradicionais como sistema de inovação, tríplice hélice ou cluster. Desse modo, levou a um uso e aplicação ambíguo do conceito. Portanto, um uso mais rigoroso do termo defendido por Ritala e Almpanopoulou (2017) é necessário, como descrito a seguir.
Em direção a um maior rigor na pesquisa sobre ecossistemas de inovação
Ritala e Almpanopoulou (2017) são enfáticos,
“vale a pena investigar a inovação sob o conceito ecossistêmico”.
Os autores defendem que mesmo que um projeto de pesquisa perfeito não seja possível, várias formas de investigação acadêmica sobre os importantes fenômenos da vida real são úteis. Assim, por meio da modelagem de simulação e teorias relacionadas, os estudos de ecossistemas de inovação podem evoluir de meramente descritivos para se tornar mais preditivos.
Estudos de simulação (por exemplo, dinâmica do sistema, modelagem baseada em agentes) também podem compreender com mais sucesso a complexidade e a dinâmica dos ecossistemas de inovação. Em geral, a simulação é útil para expor as complexas conexões entre construtos ou os resultados de interações entre numerosos processos organizacionais e estratégicos, especialmente à medida que se desdobram ao longo do tempo. Além disso, o estudo de fenômenos dinâmicos como os ecossistemas de inovação pode fornecer uma compreensão rica sobre como e por que desses processos.
O caminho a seguir: algumas soluções e questões abertas
Algumas questões sobre o conceito de ecossistemas de inovação pouco afirmadas na literatura e criticadas por Oh et al. (2016) foram abordados por Ritala e Almpanopoulou (2017). De forma que, os tópicos a seguir são uma resposta positiva do uso da terminologia de ecossistemas de inovação.
Se e como os ecossistemas de inovação diferem dos sistemas nacionais e regionais de inovação
Ritala e Almpanopoulou (2017) consideram as iniciativas públicas e os negócios privados em geral para diferenciar ecossistema de inovação e sistemas de inovação. Assim, analisam que os ecossistemas de inovação voltados para o mercado fazem o que as corporações em busca de lucros fazem melhor: inovar, competir, criar valor para o cliente e o subsequente progresso econômico.
Ainda, complementam, citando que embora apenas o tempo pode determinar a tração desses conceitos em diferentes aplicações, talvez a melhor solução seja a abrangência dos ecossistemas de inovação em iniciativas mais voltadas para o mercado. Assim, conceitos mais estabelecidos (por exemplo, sistemas de inovação) servindo para discutir políticas públicas.
Ao mesmo tempo, os sistemas regionais de inovação financiados com fundos públicos e as iniciativas de tríplice hélice não devem ser negligenciadas. Destacando que, todos os diferentes tipos são necessários para facilitar as atividades de inovação regional, nacional e global.
Mensuração do desempenho do ecossistema de inovação
Na literatura de gestão da inovação, existem várias formas mais ou menos estabelecidas de medir o desempenho. No entanto, a medição de qualquer fenômeno coletivo multi-ator é uma tarefa difícil. É provável que surjam tensões e contradições que resultam em questões sobre qual desempenho (e o quê) deve ser medido. A medição também pode permanecer completamente externa ao sistema, avaliando a competitividade relativa do ecossistema contra inovações e tecnologias concorrentes. De qualquer forma, as métricas de desempenho devem estar ligadas ao nível de análise e à questão de pesquisa.
Semelhanças e diferenças entre ecossistemas naturais e inovadores
Oh et al. (2016) critica a analogia com o ecossistema natural, uma vez que, o ecossistema de inovação é projetado e não resultado da evolução. Por sua vez, Ritala e Almpanopoulou (2017) defendem que todas as organizações e tecnologias evoluem com o tempo. Desse modo, a natureza evolutiva pode viabilizar o conceito de ecossistema de inovação para examinar fenômenos do mundo real. Para tanto, é preciso compreender o que é projetado daquilo que é resultado da co-evolução ou da auto-organização.
Por outro lado, Ritala e Almpanopoulou (2017) concordam com Oh et al. (2016) de que para melhorar a aplicabilidade do conceito, é preciso menos rigor com alguns axiomas da ecologia. Além disso, um número pequeno de outros axiomas deve ser introduzido para melhorar a analogia com o ecossistema ‘artificial’.
Por fim, os autores acreditam ser útil utilizar algumas das características do pensamento ecológico (por exemplo, coevolução). Também, do pensamento sistêmico (particularmente sistemas adaptativos complexos). Uma vez que, os estudos sobre ecossistemas de inovação podem abranger seus objetos de pesquisa de forma mais holística e realista.
Distinguir os níveis em que o termo é usado
Por fim, a ultima questão é sobre distinguir os níveis em que o termo é usado. Assim, o nível da análise pode se referir ao próprio sistema, embora o ponto focal seja uma plataforma específica. Os desafios da análise em nível de sistema são muitos. No entanto, podem ser parcialmente abordados pelo uso de diferentes metodologias, com escolhas claras sobre nível e unidade de análise.
Nesse contexto, Ritala e Almpanopoulou (2017) sugerem que o termo ecossistema de inovação seja usado em sistemas focados em atividades de inovação (objetivo/propósito). Ainda, que o termo envolva a lógica da interdependência do ator dentro de um contexto particular (dimensão espacial). Por último, aborde a cooperação inerente a evolução dos atores (dimensão temporal).
Se você quer saber mais acesse nosso ebook sobre ecossistema de inovação: alinhamento conceitual
Acesse também nosso post sobre a diferença entre ecossistema de inovação e de conhecimento and ecossistema de inovação x ecossistema de negócios
Referências
GOMES, Leonardo Augusto Vaconcelos et al. Unpacking the innovation ecosystem construct: Evolution, gaps and trends. Technological Forecasting and Social Change, v. 136, p. 30-48, 2018.
OH, Deog-Seong et al. Innovation ecosystems: A critical examination. Technovation, v. 54, p. 1-6, 2016.
RITALA, Paavo; ALMPANOPOULOU, Argyro. In defense of ‘eco’in innovation ecosystem. Technovation, v. 60, p. 39-42, 2017.
VALKOKARI, Katri. Business, innovation, and knowledge ecosystems: How they differ and how to survive and thrive within them. Technology Innovation Management Review, v. 5, n. 8, 2015.
Guilherme Paraol
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