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A evolução da transferência de tecnologia em Stanford

Ao abordar a evolução do processo de transferência de tecnologia de Stanford, Etzkowitz e Zhou (2021) apresentam dados empíricos e conclusões que podem servir de exemplo para a inovação e o empreendedorismo acadêmico de outras instituições de ensino e pesquisa.

As fases do processo de transferência de tecnologia

O primeiro evento de transferência de tecnologia da Universidade de Stanford é marcado pela primeira fase que o autor denomina de informal, onde o compartilhamento de conhecimento decorre de iniciativas individuais.

No caso de Stanford, os chefes do departamento de Engenharia Elétrica e Civil colaboraram com um empréstimo para que os ex-alunos fundassem “ Federal Telegraph Company” em 1910. A partir daí, formaram-se empresas de alunos e professores focadas em invenção sobre ondas de rádio. Todavia, com o avanço das atividades e dos entes envolvidos no processo de transferência de tecnologia percebe-se uma necessidade de orientar o corpo docente quanto às questões de licenciamento. Assim, chega-se à fase formal de acordo com Etzkowitz e Zhou (2021)

Em Stanford, criou-se um escritório para esse auxílio e para representar os objetivos da Universidade nas negociações. Porém, ainda assim, algumas empresas davam preferências à contratação de start-ups devido ao direcionamento das invenções. Nesse contexto, os autores elucidam a fase seguinte: institucionalização. Após esse estágio, a Universidade de Stanford passa para a fase da estabilização. Para Etzkowitz e Zhou (2021), tal instituição percebe sua localização estratégica e não dá outros passos, como por exemplo, a criação de uma incubadora. Mas algumas lacunas da Universidade gerou a pró-atividade por partes de alguns grupos de alunos e docentes que culminaram em programas e empresas que interagem com o Vale do Silício. A partir dessas observações, tais autores argumentam que ao longo do tempo a Universidade de Stanford teve três missões: ensino, pesquisa e empreendedorismo e que nem sempre essas missões evoluíram linearmente. E as três foram aprimoradas na medida em que se avançou o modelo empresarial. De acordo com esses autores, os resultados de pesquisa com potencial de aplicação ajudaram a gerar atividades empreendedoras por meio da transferência de tecnologia e do empreendedorismo acadêmico.

Atitudes e práticas da transferência de tecnologia

Cole (2005) observa que as universidades sintetizam a criação, a aplicação e a disseminação do conhecimento em várias ênfases, com o corpo docente distribuindo uma gama de atitudes e práticas. Nesse cenário, Etzkowitz e Zhou (2021) expõem as partes desse processo em Stanford: opositores da transferência de tecnologia; inventor desinteressado; inventor interessado; empresas sérias. Na visão da universidade:

“O meio de transferência preferencial da universidade é a publicação, com acesso gratuito para todos (…). Nessa visão, a transferência de tecnologia pela universidade deve ser limitada à extensão mais estreita possível da publicação, obtendo patentes, licenciadas para todos os interessados” (ETZKOWITZ; ZHOU, p. 4, 2021). (Tradução nossa)

transferência de tecnologia

Empreendedorismo acadêmico

O empreendedorismo acadêmico, segundo Etzkowitz e Zhou (2021), se dá pelo licensing life. Ou seja, o processo pelo qual os produtos comercializáveis do laboratório se tornam produtos tangíveis ou intangíveis por meio de patentes e start-ups.

Um conjunto típico posturas ideias em relação à ciência empreendedora pode ser discernido na experiência de Stanford, conforme tais autores a transferência pode ser:

  • Despreocupada: compromisso total com o avanço de conhecimento, evitando qualquer preocupação com o uso.
  • Amenizada: forte compromisso com o avanço combinado com um interesse secundário no uso.
  • Envolvida: compromisso igual com o avanço e uso.
  • Focada: um compromisso primário de uso e secundário compromisso de avançar.

Assim, dentre os quatros tipos, o que varia é a disponibilidade dos pesquisadores em transferir, divulgar e debater suas invenções.

Conexão com o mundo

A transferência de tecnologia originada na universidade, devido à natureza da fonte da qual surge, tem maior probabilidade de levar à criação de empreendimentos em novos campos que ainda não foram credenciados para investimento, colocando uma carga maior sobre a academia para auxiliar o processo (DA SILVA, KOVALESKI E PAGANI, 2021)

Para Etzkowitz e Zhou (2021), essa transferência é baseada em uma condição necessária, mas não suficiente, de garantir os direitos de propriedade intelectual. A intermediação e a abrangência de limites geraram novos papéis e relacionamentos, sugerindo três elementos essenciais da transferência de tecnologia acadêmica:

  • maior consciência entre professores, funcionários e alunos do potencial do conhecimento no que se refere à propriedade intelectual, publicações, palestras e titulação;
  • o interesse do inventor em desenvolver ainda mais a tecnologia e/ou colaborar com outros para fazê-lo pois há uma lacuna entre o que é produzido e o que tem potencial para ser transferido, mesmo com a obtenção de patente;
  • identificação de potenciais usuários de propriedade intelectual protegida fora da universidade;

Embora a etapa final constitua a transferência real, o sucesso depende da cultura da universidade e da política da universidade (LACK´EUS E MIDDLETON, 2015). Além disso, um movimento reverso menos conhecido, da indústria para a academia, também pode ser percebido. À medida que novas interações são geradas dentro da academia, bem como com a indústria, cria-se uma reserva de capital social é utilizada para alinhar os interesses das partes interessadas (POWELL ET AL., 2007).

transferência de tecnologia das universidades para as empresas

Interação entre Universidade e a região

Múltiplos relacionamentos helicoidais: universidade-governo, universidade-indústria e indústria-governo se cruzaram, criando o ecossistema de inovação denominado Vale do Silício na década de 1970 (ETZKOWITZ; ZHOU, 2021). A presença de capitalistas de risco na vizinhança tornou mais fácil a obtenção de financiamento e aconselhamento para os alunos e professores em Stanford do que para outros em qualquer outra universidade ”(VISE, 2005).

Etzkowitz e Zhou (2021) elucida que uma abordagem pró-ativa é indicada onde a capacidade de absorção é fraca, bem como para aumentar o sucesso em fortes regiões. Um política de transferência de tecnologia pode assumir um papel de liderança para promover a criação de um estrutura de suporte externo e também preencher as lacunas internas quando o interesse do inventor é limitado. Para o autor, há duas abordagens são típicas: (1) uma busca intensa para aumentar a taxa de divulgação e (2) assistência ao empreendedor para melhorar as chances de inovação.

Marcos na trajetória do empreendedorismo e inovação na Universidade de Stanford

Para L’ecuyer (2005) a pesquisa básica cresceu junto com comercialização, com as interações das empresas com o corpo docente às vezes apoiando interesses acadêmicos.

Etzkowitz e Zhou (2021) aponta as seguintes observações:

  • Stanford atraiu significativo apoio do governo no início do pós-guerra. A chave para a distinção acadêmica foi a atração de fundos do governo, expandindo a pesquisa de aluno-professor para grupos de pesquisa de vários membros e, em seguida, fundi-los em grupos disciplinares, permitindo que a universidade atue em projejos de larga escala.
  • O escritório especializado em transferência de tecnologia terceirizou o trabalho jurídico e focou mais no marketing.
  • A criação de empreendimentos tornou-se o modo dominante de relações universidade-indústria em Stanford, mesmo que ainda não inclua a incubação no campus.

O Vale do Silício é um ecossistema de inovação único, mas as interações helicoidais através do qual foi criado pode ser replicado. Além do talento inato ou comportamento aprendido, o empreendedorismo pode ser organizacional construído por entidades.

Os empreendedores em série de Stanford estavam ligados ao capital de risco e outros profissionais de start-up. Uma lacuna se abriu para o corpo docente sem esses laços ou menos inclinado para a atividade empresarial, portanto para explorar esse potencial foi necessário uma estrutura de suporte multifacetada. O sucesso é baseado em uma universidade empreendedora localizada ao lado de uma região vibrante de alta tecnologia.

A experiência de Stanford pode ser utilizada como um exemplo para a integração tradicional e novos papéis acadêmicos; a universidade e sua região.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COLE, J., 2005. The Great American University. Machete, New York.
DA SILVA, V.J., KOVALESKI, PAGANI, R., 2021. Fundamental Elements in Technology Transfer: an in-depth analysis. Technol. Anal. Strategic Manag.
ETZKOWITZ, H.; ZHOU, C. Licensing life: The evolution of Stanford university’s technology transfer practice. Technological Forecasting & Social Change. Elservier. 2021. https://doi.org/10.1016/j.techfore.2021.120764
L´ECUYER, C., 2005. Making Silicon Valley: Innovation and the Growth of High Tech, 1930–1970. MIT Press, Cambridge, MA.
VISE, D., 2005. Google. Delacorte, New York.
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Juliana de Souza Corrêa

Doutoranda em Engenharia e Gestão do Conhecimento na Universidade Federal de Santa Catarina. Mestre em Engenharia e Gestão do Conhecimento pela UFSC, formada em Relações Internacionais (UFSC) e com especialização em Inovação em Gestão Pública. Servidora da UFSC, atuando junto à SINOVA e integrante do Grupo VIA realizando pesquisas com foco em inovação e empreendedorismo universitário.