Ambidestria e Inovação Aberta: será que dá match?
O fato de que a inovação tem se tornado o motor propulsor das empresas mais promissoras da atualidade não é novidade. Sejam empresas tradicionais ou aquelas com modelos de negócios mais disruptivos – como as startups – a globalização e clientes cada vez mais exigentes impulsionam as empresas a inovarem para se manterem competitivas no mercado.
Entretanto, importante perceber que a inovação não é simples de conduzir e sem planejamento seus resultados podem se distanciar dos esperados.
Nos estudos da área, é comum separar os processos de inovação entre aqueles de exploração e de explotação. Assim, a exploração se refere a inovações disruptivas e a explotação a inovações incrementais.
Enquanto as inovações disruptivas podem ser interpretadas como estratégias para desenvolver novas soluções – sejam produtos ou serviços – ou descobrir mercados completamente novos e até então desconhecidos, as inovações incrementais procuram se endereçar para as necessidades atuais dos consumidores e para os modelos de negócios já conhecidos [1].
Nesse aspecto, em uma empresa, a explotação é importante para garantir sustento e desempenho, enquanto a exploração é importante para a busca de crescimento e acompanhamento das tendências globais de mercado.
Em suma, funciona assim: a exploração se direciona para processos de pesquisa, descobertas, experimentação, sempre com o objetivo de explorar aquilo que até então é desconhecido [2]. Através da exploração uma empresa busca antecipar tendências ou desenvolver algo para uma demanda que até então não foi resolvida ou poderia ser resolvida de uma maneira nova e melhor.
Por sua vez, a explotação tende a se inclinar para processos que vão ao contrário desses, como o refinamento, escolha, produção, eficiência, seleção, implementação e execução [2]. É aquela inovação que garante o sustento do modelo de negócios como ele já é, por isso, também é associado a melhoria contínua e ao aumento do desempenho. Em síntese, é inovar com o objetivo de melhorar aquilo que a empresa já faz.
Por isso que é preciso tomar cuidado com a falácia de que: “Inovamos, então estamos seguros”.
Quando há exploração em detrimento da explotação, acaba-se por haver custos com experimentação sem obter a maioria de seus benefícios, visto que muitas ideias novas surgem, mas não são desenvolvidas e há muito pouca competência distintiva. Por outro lado, apenas explotação com exclusão da exploração faz com que a empresa fique presa em equilíbrios estáveis abaixo do ideal. Nesse contexto, manter um equilíbrio adequado entre ambas é o que garante a sobrevivência e prosperidade da empresa [2].
É desse dilema que surge a ambidestria organizacional.
Ambidestria: contrários que se equilibram
Compreendendo, portanto, que aqueles que focam em inovar apenas para ficarem bons naquilo que já desenvolvem tendem a se tornar mestres em melhorar tecnologias obsoletas, enquanto aqueles que se especializam demais em descobrir novas tendências nunca vão saber aproveitar o impacto de suas descobertas [3], a ambidestria surge como a resposta para garantir um equilíbrio essencial para a sobrevivência a longo prazo das organizações.
Nesse aspecto, conscientes de que o equilíbrio entre exploração e explotação garante maiores chances de sucesso do que a intensificação em um foco estritamente único para uma delas, emerge a necessidade de administrar duas estratégias que não apenas possuem complexidades específicas de cada uma, como, por vezes, são contrárias.
Em outro post nos aprofundamos em como a ambidestria organizacional funciona e pode ser administrada nas empresas, e hoje vamos nos aprofundar em como a Inovação Aberta pode ser uma aliada para que as empresas se tornem ambidestras.
E a Inovação aberta?
Com as atenções de empresas, governos e pesquisadores se voltando para o potencial de colaboração e da cadeia de valor ecossistêmica, a inovação aberta têm sido pauta constante para estudiosos da área.
O conceito de inovação aberta é bem mais recente se comparado ao de inovação em si. Tendo sido introduzido em 2003 por Chesbrough em seu livro “Open Innovation: The New Imperative for Creating and Profiting from Technology”, a inovação aberta conquista cada vez mais interesse, sobretudo pelo papel que esteve a desempenhar durante a crise do novo coronavírus, que você pode ler mais a respeito em nosso post: Inovação Aberta como enfrentamento ao Novo Coronavirus.
A inovação aberta surge com a perspectiva de que o modelo de inovação das empresas tradicionais está ultrapassado, ao buscarem desenvolver seus produtos inovadores de forma isolada, dentro de seus muros, e com receio de serem interceptadas pelos seus concorrentes. Hoje, as empresas já compreenderam que quanto mais se aproveita do ecossistema onde estão inseridas, maiores a chance de alavancar o seu desempenho em inovação.
Dessa forma, há dois tipos importantes de processos para a geração de inovação aberta: outsite-in (ou inbound: de fora pra dentro) e insideout (ou outbound: de dentro pra fora), conforme apresenta-se na figura a seguir:
O processo de outside-in envolve a abertura dos processos de inovação de uma empresa a muitos tipos de entradas e contribuições externas, sendo aquele que tem recebido a maior atenção, tanto na pesquisa acadêmica quanto na prática da indústria.
Já o processo de insideout para a inovação aberta caracteriza-se como um fluxo de dentro para fora e exige que as organizações permitam que ideias não utilizadas e subutilizadas saiam da organização para outras pessoas usarem em seus negócios e modelos de negócios.
E o que a inovação aberta tem a ver com ambidestria?
A inovação aberta tem sido vista como estratégia promissora para a viabilização da ambidestria dentro das organizações.
Estudos demonstram que organizações que adotam uma estratégia interna de ambidestria alinhada com estratégias de inovação aberta tem maior desempenho em relação àquelas que adotam apenas ambidestria com focos estritamente fechados e internos [4].
Não obstante, é possível identificar que quanto mais aberta a estratégia inovativa, maior o alcance da ambidestria nos processos da empresa. Alguns autores chegam até mesmo a afirmar que uma organização jamais poderá aliviar efetivamente a tensão na alocação de recursos para a ambidestria se depender apenas de seus recursos internos [5] [6].
Assim, a inovação aberta em processos in-bound pode ajudar as empresas a obter recursos e uma base de conhecimento mais ampla enquanto desenvolvem seus próprios recursos exclusivos para obter uma vantagem competitiva, combinando seus próprios recursos e os recursos externos obtidos [5].
Na mesma linha, um nível proporcional de inovação aberta em processos out-bound facilita a ambidestria, permitindo que uma empresa supere as tensões inerentes à busca simultânea de atividades de exploração e explotação, evitando armadilhas de competência e gerando benefícios que excedem seus custos [5].
Enquanto alguns parceiros externos fornecem um conjunto de conhecimentos tecnológicos avançados, outros parceiros podem oferecer ideias de inovação e informações de mercado bem estabelecidas. Em ambos os casos, as atividades de exploração e explotação serão facilitadas pelo esforço de busca de firmas diferenciadoras para aplicação dos insumos oferecidos por esses parceiros externos [6].
Em particular, ao usar o conjunto de novos conhecimentos externos, as empresas provavelmente reduzirão custos e riscos para invenções internas, explorarão novas tendências tecnológicas e mudarão facilmente para mercados emergentes, promovendo assim a inovação em exploração. Em termos do conjunto de conhecimento existente, as empresas serão motivadas a buscar mais conhecimento local e relevante e utilizar os recursos atuais em domínios específicos, que são a base da inovação de explotação [6].
REFERÊNCIAS
[1] KANG, Shinhyung; HWANG, JungTae. An investigation into the performance of an ambidextrously balanced innovator and its relatedness to open innovation. Journal of Open Innovation: Technology, Market, and Complexity, v. 5, n. 2, p. 23, 2019.
[2] MARCH, James G. Exploration and exploitation in organizational learning. Organization science, v. 2, n. 1, p. 71-87, 1991.
[3] MACHER, Georg; VELEDAR, Omar. Balancing Exploration and Exploitation Through Open Innovation in the Automotive Domain–Focus on SMEs. In: European Conference on Software Process Improvement. Springer, Cham, 2021. p. 336-348.
[4]. VAN LIESHOUT, Johannes WFC et al. Connecting strategic orientation, innovation strategy, and corporate sustainability: A model for sustainable development through stakeholder engagement. Business Strategy and the Environment, 2021.
[5] LI, Ruijie; FU, Lihua; LIU, Zhiying. Does openness to innovation matter? The moderating role of open innovation between organizational ambidexterity and innovation performance. Asian Journal of Technology Innovation, v. 28, n. 2, p. 251-271, 2020.
[6] DĄBROWSKA, Justyna; LOPEZ‐VEGA, Henry; RITALA, Paavo. Waking the sleeping beauty: Swarovski’s open innovation journey. R&D Management, v. 49, n. 5, p. 775-788, 2019.
Carlos Marcelo Faustino da Silva
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