Lean Startup: O Que As Empresas Podem Aprender Com As Startups

Lean Startup: o que as empresas podem aprender com as startups

Com o avanço no desempenho das startups, muitos pesquisadores e empreendedores voltaram suas atenções para esses negócios e suas práticas. Com intervenções inovadoras, mas que por vezes se apoiam em adaptações de outras práticas, esses empreendimentos têm conquistado cada vez mais mercado. Nesse aspecto, o Lean Startup surge como uma abordagem que contempla o desenvolvimento das startups, mas não se resume exclusivamente a elas. Assim, demonstra de forma didática o que as empresas podem aprender com as startups.

Startups, Negócios tradicionais e o Lean Startup

O fato de que as startups utilizam inovação para entregar valor em seus modelos de negócios não é novidade. Isso porque essas empresas precisam se sobrepor a uma série de desafios associados às etapas iniciais de sua estruturação. Portanto, é através da inovação que encontram meios de lidar com a escassez de recursos e o ambiente de fortes incertezas que compõem o contexto onde diversos desses negócios inovadores se inserem [1].

Lean Startup: o que as empresas podem aprender com as startups

Startups – empresas altamente inovadoras, mas em contexto de incertezas. | Imagem: unsplash.

De tal modo, mais do que inovar em produtos ou serviços, temos acompanhado um grande movimento dessas empresas de inovarem propriamente em seus modelos de negócios. As startups aprenderam que para reduzir os riscos de falhar em atender as necessidades do consumidor, um desenvolvimento ágil e iterativo tem grande importância. Dessa maneira, agem a fim de identificar se a solução desenvolvida abraça as demandas de forma variável, ou seja: possibilitando mudar sua abordagem sem grandes empecilhos e implementar o que foi aprendido junto com o consumidor num ciclo contínuo de entrega de valor [5].

 Assim, as startups apresentam cada vez mais elementos-chave que se distinguem dos comumente associados à estruturação dos negócios tradicionais. Entretanto, esses elementos não precisam se separar da abordagem dos negócios tradicionais. Pelo contrário, esse tipo de empresa, e até mesmo as indústrias [5], podem se beneficiar ao aplicá-los em suas próprias práticas. Portanto, na perspectiva das startups e suas inovações para complementar a proposta de valor e o desenvolvimento sustentável, surge o Lean Startup.

Origem do Lean Startup

O Lean Startup têm ganhado grande destaque, chegando a ser considerado como a principal metodologia de abordagem por algumas aceleradoras [3]. O conceito de Lean parte de uma abordagem que agregue valor ao cliente ao mesmo tempo em que elimina aquilo que não agrega, também chamado de “desperdício”.

Assim, emergindo da combinação do “Lean” com os princípios observados na criação e desenvolvimento de startups, criou-se o Lean Startup, ou “Startup Enxuta” [1]. Dessa forma, a metodologia baseia-se em um ciclo constante onde o feedback dos clientes transforma-se em um aprendizado que guiará as decisões da startup durante todo seu desenvolvimento sustentável.

Aprofundando nos princípios

Um dos maiores nomes envolvidos nesse conceito é o de Eric Ries, que aprofundou expressivamente os princípios do modelo em seu livro “A Startup Enxuta” (2011). Nesse aspecto, ele fez a abordagem do Lean Startup baseando-se em 5 princípios:

  • “Empreendedores estão por toda parte”. O autor parte da definição de startup como uma instituição humana. Dessa forma, itera, a abordagem do Lean Startup pode funcionar em empresas de qualquer tamanho e atividade.
  • “Empreender é administrar”. Reforça que a startup não é um produto ou serviço, mas sim uma instituição. Portanto, empreender é lidar com a gestão dessa instituição considerando suas especificidades, tais como o ambiente de extrema incerteza.
  • “Aprendizado validado”. Mais do que ganhar clientes ou lucrar, compreende-se a razão da startup como sendo o desenvolvimento de um negócio sustentável. Assim, conferem-se meios científicos frequentes e constantes que retroalimentam a validação da proposta.
  • “Construir-medir-aprender”. As startups chegam com a premissa de focar no que é conhecido como “dor” dos clientes. De tal modo, a ideia que surge como proposta de valor deve ser constantemente acelerada em um ciclo de feedbacks. O retorno obtido é o que subsidiará a decisão de pivotar (ou seja, alterar ou adaptar sua proposta) ou continuar com aquilo que se está propondo. Em alguns casos, o descarte da ideia também pode ser considerado.
  • “Contabilidade para inovação”. Aqui o autor diz respeito a assuntos que pontua como “menos interessantes”, visto que o ato de empreender também compreende a responsabilidade de lidar práticas administrativas e métricas de progresso. Entretanto, ressalta, isso requer uma intervenção que corresponda a natureza de startup do empreendimento.

Assim, define finalmente o Lean Startup como “um conjunto de práticas para ajudar os empreendedores a aumentar suas chances de desenvolver uma startup de sucesso” [6].

Lições do Ciclo do Lean Startup

Como dito, na abordagem do Lean Startup, a proposta de valor está sempre sendo alimentada por feedbacks. Isso faz com que a solução vá se aprimorando e cada vez mais acompanhe as tendências do que os clientes esperam. Entretanto, no contexto considerado, é preciso fazer isso de forma ágil e assim minimizar o tempo total que compreende esse ciclo de entrega e feedback.

Ciclo de feedback “Construir-Medir-Aprender”

Lean Startup: o que as empresas podem aprender com as startups

Fonte: elaborado pelo autor, adaptado de Ries (2011) [6].

O ciclo de “construir-medir-aprender” é central no desenvolvimento das startups [6], sempre levando em consideração que mais do que um produto, o objetivo é tornar-se um negócio sustentável através da entrega de valor. Assim, considerando a evolução contínua gerada por este ciclo, destaca-se a necessidade de minimizar o tempo total gasto nele.

Nesse aspecto, entra o já popular na área de empreendedorismo “MVP” ou Mininum Viable Product (Produto Mínimo Viável). O MVP compreende a forma mais rápida de gerar feedbacks. Isso, porque permite testar a hipótese da proposta de valor em questão empregando o mínimo de recursos que for necessário.

Considerações sobre o MVP

Destaca-se: o MVP não se trata de um algo inacabado ou parte do produto. Desse modo, define-se como uma versão inicial que seja capaz de completar o ciclo “construir-medir-aprender” empregando o mínimo de recursos. Entretanto, através dele, deve-se conseguir testar de forma clara e mensurável a solução que está sendo desenvolvida.

O MVP proporciona as startups a possibilidade de construir sua solução juntamente com o consumidor, entendendo assim de forma muito precisa suas necessidades. Dessa forma, é uma ferramenta eficaz para acompanhar tendências e mudanças nas visões de mercado, ao passo que é desenvolvido rapidamente por conta de empregar apenas os recursos mínimos necessários. A figura a seguir traz uma comparação entre essas duas visões para melhor expor o papel do MVP:

Lean Startup: o que as empresas podem aprender com as startups

Fonte: adaptado de Kniberg, 2016 [7].

Assim, muitas pessoas podem pensar: mas para recolher feedbacks mais assertivos, não seria melhor desenvolver a versão final do produto? Bom, não é isso que tem levado ao sucesso das startups. Partindo do pressuposto que são negócios altamente inovadores que não possuem um mercado validado e lidam com a incerteza de seu progresso, não faz sentido testar seu produto final. Isso porque, em caso de necessidade de alteração, já teria sido empregado muito tempo e recurso no seu desenvolvimento. Dessa maneira, o MVP surge como um método eficaz de validar hipóteses de solução minimizando os desperdícios no processo. Além disso, permite a construção junto com o público, aumentando suas chances de aceitabilidade.

Portanto, ao elaborar um MVP deve-se compreender que esses protótipos ou produtos precisam ser capazes de testar com eficiência a hipótese, entregando o máximo de valor possível, mas empregando o mínimo de tempo, esforço e recursos. Diversas metodologias são empregadas para a elaboração dos MVPs, partindo desde mockups (telas interativas) até landing pages, onde apresenta-se a proposta de valor numa página de internet que seja capaz de recolher feedbacks.

O Modelo de Negócios no Lean Startup

Empreendimentos em estágio iniciais frequentemente ouvem sobre a importância de um plano de negócios detalhado que deve prever alguns aspectos de atuação. Assim, Steve Blank (2007) [2], um dos precursores do movimento do Lean Startup, argumenta sobre o porquê de as startups não focarem nisso em seus estágios iniciais. Segundo ele, em vez de estabelecer um plano de negócios, e seguindo a ideia de que as startups devem se testar no mercado de forma iterativa e experimental para guiar os feedbacks na construção de valor, também o modelo de negócios é construído através dessa “aprendizagem validada”, considerando o princípio reiterado posteriormente por Ries (2011).

Nesse sentido, muitas das versões onde aponta-se a abordagem do Lean Startup sugerem o Business Model Canvas (BMC) – de Osterwalder and Pigneur. Esse, refere-se a uma junção de nove quadros que integram elementos de um modelo de negócios [2]. Um estudo recente sobre a abordagem do Lean Startup em 227 empresas identificou, sobretudo, que o BMC era a ferramenta associada a metodologia mais utilizada por elas (91%), mais até mesmo que o próprio MVP (64%) [4].

Considerações sobre o Business Model Canvas

De tal modo, o BMC sugere uma espécie de mapeamento da criação, captura e entrega de valor por parte de uma organização, através do estabelecimento de elementos-chave, sendo eles: Proposta de Valor, Segmento de Clientes, Relacionamento com Clientes, Canais, Parceiros-chave, Atividades-chave, Recursos-chave, Custos, Fontes de Receitas.

É muito comum, sobretudo, ver em ambientes de inovação como pré-incubadoras ou incubadoras, onde os negócios ainda estão em fase de estruturação, os quadros de BMC sendo utilizados com post-its. Dessa forma as ideias afloram e mudam conforme o desenvolvimento vai ocorrendo ou surgem novos feedbacks. Assim, o próprio modelo de negócios envolve-se numa constante evolução que acompanha o ciclo de entrega de valor proposta pelo empreendimento.

Nesse sentido, estudos chegam a apontar que empreendedores digitais embarcando na utilização do Lean Startup usam a modelagem de negócios através do BMC de forma consistente para otimizar algumas diretrizes que permanecem abstratas no Lean Startup. Assim, traduzem em elementos mais concretos e pragmáticos as informações relevantes vindas de dentro e de fora da organização [2]. Dessa forma, apontam que a modelagem de negócios integrada ao Lean Startup ajuda os empreendedores em diversos aspectos, como: formular hipóteses testáveis ​​a respeito da viabilidade de suas startups; filtrar, selecionar e organizar informações externas e internas incompletas ou difusas e projetar experimentos e testes multidimensionais para o cliente que giram em torno da noção de valor, por meio do que chamam de Modelos de Negócios Mínimos Viáveis [2].

Lean Startup: o que aprender com as startups

Em um aspecto geral, podemos afirmar que o Lean Startup traz uma forma de aprender com as startups. Por todas essas práticas que têm levado ao sucesso dessas empresas, percebe-se cada vez mais a popularização de suas abordagens. Dentre as vantagens percebidas pela adoção dessa metodologia em negócios já estabelecidos destacam-se a redução de tempo e custo para teste e inicialização de um negócio, alinhamento da ideia às necessidades reais dos clientes e a otimização para verificar e dinamizar todos os parâmetros do modelo de negócios [4]. Além disso, a utilização desse método permite que seus usuários rapidamente se adaptem quando há mudanças bruscas nas condições de mercado ou nas necessidades dos consumidores [5].

Portanto, suas práticas oferecem muitas possibilidades para as empresas, não apenas as startups. Visto que sua abordagem em aspecto geral permite acelerar o desenvolvimento de soluções enquanto torna o processo inovativo mais barato, flexível e com maiores chances de aceitação [5] [6].

Dica de leitura

Você pode conhecer profundamente o contexto histórico, as origens e cases do Lean Startup no livro: A Startup Enxuta – Como usar a inovação contínua para criar negócios radicalmente bem-sucedidos, de Eric Ries, 2011.

Lean Startup: o que as empresas podem aprender com as startups

Fonte: unsplash.

REFERÊNCIAS

[1] GHEZZI, Antonio; CAVALLO, Angelo. Agile business model innovation in digital entrepreneurship: Lean startup approaches. Journal of business research, v. 110, p. 519-537, 2020.

[2] GHEZZI, Antonio. How Entrepreneurs make sense of Lean Startup Approaches: Business Models as cognitive lenses to generate fast and frugal Heuristics. Technological Forecasting and Social Change, v. 161, p. 120324, 2020.

[3] MANSOORI, Yashar; KARLSSON, Tomas; LUNDQVIST, Mats. The influence of the lean startup methodology on entrepreneur-coach relationships in the context of a startup accelerator. Technovation, v. 84, p. 37-47, 2019.

[4] GHEZZI, Antonio. Digital startups and the adoption and implementation of Lean Startup Approaches: Effectuation, Bricolage and Opportunity Creation in practice. Technological Forecasting and Social Change, v. 146, p. 945-960, 2019.

[5] JESEMANN, Isabella et al. Investigation of the “lean startup” approach in large manufacturing companies towards customer driven product innovation in SMEs. Procedia CIRP, v. 99, p. 711-716, 2021.

[6] RIES, Eric. The Lean Startup: How today’s entrepreneurs use continuous innovation to create radically successful businesses. Currency, 2011.

[7] KNIBERG, H. Making sense of MVP (Minimum Viable Product) – and why I prefer Earliest Testable/Usable/Lovable. Disponível em: <https://blog.crisp.se/2016/01/25/henrikkniberg/making-sense-of-mvp> Acesso em: jul. 2021.

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Carlos Marcelo Faustino da Silva

Mestre em Engenharia e Gestão do Conhecimento, um dos primeiros pesquisadores nacionais a abordar ambidestria organizacional sob a perspectiva da inovação aberta. Contador pela UFMT, mentorava startups desde a graduação, por isso começou a atuar próximo a ambientes de inovação, já tendo fundado e administrado núcleos de incubação de empresas. Atualmente, segue mentorando startups e empresas de outras configurações, e estudando estratégias para melhorias de metodologias em ambientes de inovação.