Universidade Empreendedora

As múltiplas faces da Universidade Empreendedora

As regiões com melhores indicadores econômicos são também aquelas cujo ambiente é capaz de gerar maior conhecimento e inovação (Huggins e Izushi, 2007). Neste contexto, as universidades podem desempenhar um papel crucial como produtoras e disseminadoras de conhecimento (KIRBY, 2006).

As múltiplas faces da Universidade Empreendedora

universidade empreendedoraNo artigo intitulado “The multiple faces of the entrepreneurial university: a review of the prevailing theoretical approaches” Cerver Romero et al, (2020) constatam que ao longo das últimas décadas, o papel central desempenhado pelas Universidades Empreendedoras (UE) na economia baseada no conhecimento tem despertado um interesse crescente entre os acadêmicos, que têm concentrado os seus esforços de investigação em diferentes aspectos. Nesse sentido, Romero et (2020), realizaram seu estudo com base nos seguintes objetivos:

1) determinar as linhas de pesquisa que constituem a estrutura intelectual;

2) identificar as principais contribuições de pesquisa no domínio da UE; e

3) distinguir as revistas científicas com maior impacto na área temática, bem como os autores mais destacados.

Para atingir os objetivos, a autoria primeiramente realizou uma análise descritiva dos artigos emergentes da pesquisa, após se aplicou a metodologia bibliométrica de análise de cocitação. A recuperação dos dados foi realizada por meio da busca por artigos que tivessem o termo “Entrepreneur * Universit *” no título, resumo ou palavras-chave e que tivessem sido publicados em periódicos das categorias de gestão, negócios e economia, sem aplicação de qualquer filtro de ordem cronológica na base Web of Science.

O resultado foi um total de 479 documentos escritos em inglês, com datas de publicação entre 1983 e 2018.

Iniciativas de uma Universidade Empreendedora

As universidades empreendedoras são aquelas que visam maximizar a aplicação do seu conhecimento, ao mesmo tempo que criam valor para a sociedade e adotam uma estratégia de formulação de objetivos acadêmicos (ETZKOWITZ, 2003; CERVER ROMERO et al, 2020).

De acordo com o artigo, as universidades empreendedoras possuem iniciativas “hard” e iniciativas “soft”.

As iniciativas “hard” são aquelas mais próximas do paradigma empreendedor, como patentes e licenciamento, ou a criação de spin-ofs e parques tecnológicos, enquanto iniciativas “soft/leves” são aquelas mais próximas do paradigma tradicional, como a publicação de pesquisas acadêmicas, bolsas ou a produção de graduados altamente qualificados
Entre os dois extremos, existem também outras iniciativas empreendedoras, como consultoria, formação de pessoal da indústria ou pesquisa.

Para os autores, as iniciativas “hard” podem contribuir diretamente para o desenvolvimento econômico, por exemplo, através da criação de novas empresas através do desenvolvimento de spin-offs universitárias.
Por outro lado, a contribuição também pode ser feita indiretamente, apoiando a criação de novas empresas em parques tecnológicos ou licenciando patentes a parceiros da indústria. Por exemplo, novos conhecimentos incorporados numa patente podem permitir ao parceiro industrial obter uma vantagem competitiva e, assim, crescer e criar oportunidades de emprego

As restantes atividades empreendedoras contribuem indiretamente para o crescimento econômico. No caso de pesquisa contratada, a pesquisa ajudará a empresa a resolver um problema prático que poderá melhorar o seu desempenho. Através de cursos de formação para o pessoal da indústria, as empresas podem aumentar as suas capacidades e, consequentemente, a sua competitividade.
Tanto as bolsas de estudo como a publicação de pesquisa de qualidade aumentam a reputação da UE, o que, em ambos os casos, pode atrair empresas externas para a região e gerar novas relações universidade-indústria, que, por sua vez, permitem o arranque de atividades empreendedoras “hard”.

Da mesma forma, os serviços de consultoria também podem aumentar o desempenho empreendedor e ser a origem de novas relações universidade-empresa que podem mais tarde ser exploradas através de outras atividades.

Ainda, através do ensino, a UE proporciona à indústria talentos altamente qualificados e, desta forma, satisfaz a sua procura de capital humano.

Além de prosseguir o desenvolvimento social e econômico através das iniciativas empreendedoras acima mencionadas, outra característica da UE é que pretende ser mais produtiva e criativa, estabelecendo relações inovadoras entre as suas dimensões de ensino e pesquisa.

Entre as suas outras características distintivas estão a sua capacidade de se adaptar às mudanças no ambiente e de conceber políticas destinadas a desenvolver uma cultura organizacional empreendedora, e também, no que diz respeito à gestão e governança universitária, que comumente utiliza práticas de gestão típicas do setor com fins lucrativos.

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Resultados

De acordo com o artigo, os cinco artigos com maior número de citações são:
1. Etzkowitz, H., Webster, A., Gebhardt, C., & Terra, BRC (2000). O futuro da universidade e a universidade do futuro: evolução da torre de marfim para o paradigma empreendedor. Política de Pesquisa, 29(2), 313–330. (802 citações).
2. Etzkowitz, H. (2003b). Grupos de pesquisa como ‘quase-empresas’: A invenção da universidade empreendedora. Política de Pesquisa, 32(1), 109–121. (531 citações). 3
3. Etzkowitz, H. (1998). As normas da ciência empreendedora: efeitos cognitivos das novas ligações universidade-indústria. Política de Pesquisa, 27(8), 823–833. (476 citações)
4. Etzkowitz, H. (2003a). Inovação em inovação: A hélice tripla das relações universidadeindústria-governo. Informações em Ciências Sociais nas Ciências Sociais, 42(3), 293–337. (375 citações
5. Deem, R. (2001). Globalização, Novo Managerialismo, Capitalismo Académico e Empreendedorismo nas Universidades: A dimensão local ainda é importante? Educação Comparada, 37(1), 7–20. (244 citações)

No que diz respeito às fontes, como resultado da análise, foi identificado um total de 269 revistas que publicaram trabalhos sobre o tema. Quanto ao número de artigos publicados por cada periódico, destacam-se o Journal of Technology Transfer (com 26 artigos), Research Policy (16 artigos), Higher Education (11 artigos) e o International Journal of Technology Management (11 artigos).

As palavras-chave mais comuns são Inovação (78 publicações), Transferência de tecnologia (58 publicações), Conhecimento (51 publicações), Desempenho (49 publicações), Universidade empreendedora (45 publicações), Ciência (43 publicações), Hélice tripla (36 publicações) e Indústria (32 publicações).

Ainda, os autores identificaram seis clusters com autores que com abordagem da Universidade Empreendedora:

  1. Tríplice Hélice: A ideia de uma universidade empreendedora (Etzkowitz 1983), que está integrada, juntamente com a indústria e o governo, num sistema complexo e coerente de relações que tornam possível a inovação
  2. Sociedade do Conhecimento: os trabalhos exploram a forma como as UE contribuem para o desenvolvimento regional e nacional.
  3. Perspectiva globalizada: A globalização é um dos fatores que pode ajudar a explicar a transformação das universidades em organizações empreendedoras.
  4. Pesquisador x Empreendedor: Os estudos deste cluster se concentram no papel dos pesquisadores e exploram vários aspectos relacionados ao empreendedorismo acadêmico.
  5. Dupla personalidade: Tanto a incorporação da terceira missão como a transição da universidade para um modelo empreendedor implicam mudanças radicais na sua organização e gestão.
  6. Frenesi: Os autores questionam se existe um modelo único ou ideal para a UE e sugerem que, ao conceberem estratégias para alcançar a terceira missão, os gestores universitários devem ter em conta as capacidades específicas e o contexto operacional da sua universidade. Argumentam que, para além do patenteamento, do licenciamento e dos spin-offs, existem outras formas de transferência de conhecimento e criação de riqueza no ambiente económico da UE.

Conclusão

A partir do estudo de Cerver Romero et al (2020) pode-se identificar como o tema das Universidades Empreendedoras vem sendo abordado, seja os artigos mais citados, as revistas com maior impacto, países e palavras-chave. Ainda, o estudo levantou seis clusters de abordagem da temática.

Percebeu-se que uma UE é composta por múltiplas faces e que sua atuação tem sido objeto de pesquisa tendo em vista as diversas dimensões que permeiam as atividades universitárias: individual, gestão, ensino, pesquisa, inovação, internacionalização, recurso financeiro, fatores contextuais, fatores institucionais, fatores organizacionais, infraestrutura, cultura empreendedora e impacto.

Confira o Ranking das Universidades Empreendedoras do Brasil.

Referências Bibliográficas

CERVER ROMERO, Elvira; FERREIRA, João JM; FERNANDES, Cristina I. The multiple faces of the entrepreneurial university: A review of the prevailing theoretical approaches. The Journal of Technology Transfer, v. 46, n. 4, p. 1173-1195, 2021.

ETZKOWITZ, H. Research groups as ‘quasi-firms’: the invention of the entrepreneurial
university. Research Policy, 2003.

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Juliana de Souza Corrêa

Mestranda em Engenharia e Gestão do Conhecimento na Universidade Federal de Santa Catarina, formada em Relações Internacionais (UFSC) e com especialização em Inovação em Gestão Pública. Servidora da UFSC e integrante do Grupo VIA atuando junto ao Pacto pela Inovação de Santa Catarina e realizando pesquisas com foco em inovação e empreendedorismo.

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